sexta-feira, março 05, 2010

ARTIGO DO ECONOMISTA E PROFESSOR DA UFRPE JACKES RIBEMBOIM

Vai para o trono ou não vai? Publicado em 29.01.2010


Jacques Ribemboim; jacquesribemboim@oi.com.br




Luís Inácio Lula da Silva está prestes a conquistar o pedestal da glória e se tornar o melhor presidente brasileiro de todos os tempos (nunca antes na história desse país...). Os índices de aprovação são contundentes, aqui ou no exterior, seu nome é aclamado. No Nordeste é adorado, nos Estados Unidos, he is the man, e na França, acaba de ser eleito o homem do ano pelo Le Monde.
Não obstante a euforia, o título de maior-e-melhor requer a baliza do tempo. Será necessário esperar alguns anos para sua outorga definitiva. Isto porque os desequilíbrios gerados em seu governo deverão explodir adiante, fora do seu mandato. O inchaço da divida interna, o rombo da previdência, as tensões latifundiárias, o caos urbano, o menosprezo à agenda ambiental e, finalmente, a fórmula mágica com que enfrentou a crise mundial, diferindo no tempo as mazelas da recessão, são questões que pincelam cinzento no horizonte econômico brasileiro de médio e longo prazos.
É verdade que Lula consolidou a boa imagem do País no cenário internacional, aliás, iniciada por seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso. Além disso, os avanços sociais foram significativos, sobretudo na zona rural, com a ampliação dos programas de transferência direta de renda, universalização da educação e eletrificação rural. A balança comercial brasileira manteve-se equilibrada e as reservas internacionais bateram sucessivos recordes.
O jeitão do presidente conquistou o planeta. Para os europeus, tornou-se o símbolo exato da liderança correta para países mais pobres. Neste aspecto, distingue-se de tipos como Hugo Chávez, Zimba, Ahmadinejad, Kim Jong-II, Evo Morales ou Fernando Lugo, o padre don-juan paraguaio. Em meio a esta fauna terceiro-mundista, Lula parece um Brad Pitt.
Mas nem tudo são flores. Contra o presidente pesa o esquema de corrupção do PT e a insistência em premiar ex-terroristas com honrarias e cargos no alto escalão. De mais a mais, o presidente poderá herdar a pecha de demagogo, vez que, indubitavelmente, fala mais que cumpre, embora nem o povo nem o mundo pareçam dar importância a essas questões. A campanha fora de prazo para eleger sua sucessora e o lançamento do filme Lula - o filho do Brasil, em ano pré-eleitoral, também não lhe creditam pontos.
Suas conquistas, embora importantes, são constantemente inflacionadas pela propaganda estatal. Tome-se o caso de Pernambuco, por exemplo, onde se diz haver predileção do Planalto. Neste Estado, durante sete anos de governo, o presidente não conseguiu concluir uma única obra de envergadura. Prometeu muitas, iniciou algumas, concluiu zero. Nem refinaria, nem duplicação de BR, nem estaleiro, nem interligação do São Francisco, nem Transnordestina, nem Vila da Copa, nem Linha Verde, nem nada. Inaugurou apenas um parquinho infantil em Boa Viagem, a orla de Brasília Teimosa, um canal no Sertão, um cais em Suape e a rebimboca da parafuseta (batimento da quilha) no estaleiro Atlântico Sul. Talvez volte este ano, para mais uns quilômetros de linha férrea ou lançar algum bote ao mar.
De outro lado, o enfrentamento da crise mundial em 2008 abriu lacunas. Embora muito elogiado por lideranças internacionais, o governo enveredou pela solução fácil, abrindo mão da arrecadação e passando a gastar mais, uma inequação nem de longe levada a sério nos países desenvolvidos. Além disso, empregados do Banco do Brasil não paravam de telefonar aos correntistas, disponibilizando empréstimos em condições nunca vistas, estimulando o consumo. A classe média nunca se viu tão endividada (nunca na história desse país...). Será que tudo isto é sustentável? Nos anos 70, enfrentamos o mesmo dilema, aplicamos a mesma receita, crescemos em meio à crise e estagnamos fora dela. E quem pagou a conta foram os jovens da geração 80, filhos da década perdida.
Apesar de tudo, houve reais avanços em diversos setores e ninguém duvida das boas intenções do presidente e seu compromisso com os menos aquinhoados. Para o Nordeste, poder-se-ia mesmo dizer que, de modo geral, o saldo é positivo (apesar das promessas não cumpridas). Acertou com a ampliação do Bolsa Família, programa de há muito idealizado por Eduardo Suplicy, implementado por Cristóvam Buarque e iniciado em âmbito nacional por FHC. E também, como já frisamos, com a universalização da educação básica e a eletrificação das moradias na zona rural. Destaque-se, ainda, a sua política de ampliação e modernização das universidades federais, com abertura de novos campi no interior.
Não sei se Lula entrará para a história como o melhor presidente de todos os tempos, mas, por certo, deixará uma marca superlativa de emoção e humanidade, com todas as virtudes e defeitos que aí possam residir. Sentiremos alguma saudade se não fizer sua sucessora. E muita se o fizer.
» Jacques Ribemboim é economista.

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